Quem nunca foi assaltado?

Alguns meses antes de concluir o ensino médio, todos os meus amigos de Santana do Ipanema, que estudavam no Colégio Cenecista Santana, começavam a decidir o que iam fazer depois do colegial. As dúvidas permeavam as mentes imaturas de muitos ali, outros, no entanto, já sabiam o que iriam fazer e ser. Eu era um deles, eu queria ser padre!

Lembro quando a professora Aida, de geografia, ainda no primeiro ano, perguntou na sala de aula o que faríamos quando terminássemos o terceiro ano.

– Professora, quero fazer medicina na UFAL!

– Eu quero ser professor, professora!

– Eu vou fazer zootecnia ou pedagogia na ESSER.

– Vou fazer história em Belo Jardim.

– E você Marques, o que vai fazer?! – Perguntou a professora Aida.

– Vou ser padre! Vou para o seminário em Palmeira dos Índios e depois para o seminário em Maceió. – Disse todo confiante.

Não demorou muito fui para o seminário em Palmeira dos Índios onde passei um ano e meio e logo em seguida fui para o seminário em Maceió.

No dia em que fui para o seminário de Maceió eu estava todo ansioso, pois ia morar agora na capital do Estado. Já tinha ido algumas vezes para Maceió, mas nada que dissesse: Nossa como ele vai muito pra Maceió!

– Marques, já arrumou a sua mala?

– Já, Mãe! Está pronta.

– Ótimo! Então venha comer alguma coisa antes de viajar. – Intimou a Dona Régia.

A mala estava com tudo que precisaria para começar a morar em Maceió, porém não estava levando muita coisa, já que aos pouco compraria por lá mesmo. Poxa vida, eu ia passar oito anos no seminário!

– Mãe, já vou indo, a besta chegou! – Disse já com a mala na mão.

– Vá meu filho! Vá com Deus.

– Amém. Bênção?

– Deus lhe cubra com o manto sagrado! Olhe, tenha muito cuidado em Maceió, viu?! Vá pensando que você está em Santana… Lá num é Santana, não.

– Eu sei, Mãe. Não se preocupe.

– É bom saber, vai que você chega lá e fica com essa cara de abobado olhando os prédios… Vai acabar se perdendo!

– Mãe, tenho que ir… Fica com Deus! Tchau… – Disse entrando correndo na besta.

Chegando à capital alagoana, a besta me deixou um pouco antes do prédio da Polícia Rodoviária Federal, ponto tradicional de parada dos transportes alternativos do Sertão. Outro ponto conhecido é o do Makro. Fiquei desnorteado, pois pensava que o motorista ia me deixar na porta do seminário! Agora lascou tudo!

– Calma, vai dar tudo certo! – Disse para mim mesmo num ato desesperado para acalmar meu coração!

Peguei a mala e fui para um ponto de ônibus que avistei de longe, perto de uma banca de revista. Chegando lá, não sabia qual ônibus pegaria e muito onde desceria, já que só tinha ido uma vez ao seminário e de quebra não decorara onde ficava. Tinha apenas uma lembrança muito vaga que ficava no bairro do Farol.

Como não tive a coragem de perguntar qual ônibus passaria pelo Farol, fui arriscar no primeiro que passasse descendo a Avenida Durval de Góes Monteiro. Na minha cabeça, todo ônibus que descesse por ali ia para o Farol.

Subi no Clima Bom/Iguatemi, paguei a tarifa de R$ 1,70 e fui sentar. O ônibus estava cheio, mas tinha um lugar sobrando lá no fundão. Foi lá que eu sentei.

Tudo estava tranquilo até que entraram pela porta de saída dois rapazes, um deles sentou do meu lado e o outro ficou em pé do lado do colega. Até então tudo bem, mas logo percebi que o rapaz do meu lado estava nervoso e observava muito a minha mala. Fiquei de orelha em pé e reagi puxando conversa com ele. Vou fazer amizade!

– Hoje é um dia para ir à praia, não acha? – Perguntei.

– Oi? Ah, sim. – Respondeu todo desconfiado o rapaz.

– Queria muito ir hoje à praia. Pena que não posso… Tenho que trabalhar!

– É assim mesmo!

– Com certeza um dia as coisas melhoram, num tá cá peste!

– É verdade. – Disse o rapaz rindo.

De repente o outro que estava em pé cutucou o seu colega chamando a sua atenção e com um gesto de cabeça fez com que ele me abordasse assim:

Véi, é mal aí, mas passa o celular!

– Como é?! – Disse tenso e tremendo.

– Passa logo, Véi, ou te furo aqui mesmo! – Falou o rapaz que estava em pé levantando a camisa.

Fiquei completamente assustado, nunca tinha passado por uma situação como aquela. Tirei o celular do bolso e entreguei. Quando o que estava sentado do meu lado ia se levando o que estava em pé disse:

– Passa o relógio também! Agora, Véi! – Disse todo valente.

– Não, Véi, já está bom! O cara é gente fina! – Disse o outro tentando “amenizar” o prejuízo do assalto.

– Cala a boca e pega logo essa merda!

– Aí meu, foi mal, mas passa o relógio também!

Depois que entreguei o relógio eles desceram no primeiro ponto que o ônibus parou.

Fiquei atordoado. Sem acreditar no que tinha passado naquele momento, desci na Praça Centenário e de lá peguei um taxi até o seminário. Depois de alguns minutos, assim que a ficha caiu, fiquei revoltado e xingando muito as duas figuras que acabaram de me dar às boas vindas para minha nova cidade!

José Marques

Santos – São Paulo, 28 de dezembro de 2011.

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